domingo, 30 de agosto de 2015

A curvatura do tempo

Olho ao redor, há pouco do lugar que eu sou
Contemplo o pôr do sol cada dia mais turvo
Não é o mesmo sol quando residia no ventre materno
De onde o vejo não há céu, nem mar, nem arvoredos
Estou envolto por coisas inertes, mensuráveis, inelutáveis
Aqui permaneço, longe do cais e perto dos sonhos
A brisa que me toca é menos suave e o ar mais denso
Permaneço, enquanto pensamentos me transportam ...
Estou despido, as coisas que medeiam não me tomam, não me tornam
Do caminho percorrido, muitos trago comigo
Poucos deixei para trás [benditos sejam os sonhos]
Se quiser, posso voltar a todos e os encontrarei mais vivos
O esquecimento é proposital é sobrevivência
Aquela brisa densa, aquele sol turvo - fazem parte do caminho

O sol surge no horizonte, ainda está disforme e frio
Não é o mesmo sol quando residia no braço paterno
Eis duas fortalezas do ser humano ou do inumano mais crítico
O olhar complacente da mãe e o peso da mão áspera do pai sobre o ombro
No horizonte, se o encaro detidamente, os encontro e sei que estão aqui
Em cada célula, em cada átimo e assim sou pleno
De tudo restarão três coisas: aqueles olhos, aquela mão e o sol turvo
Eis o tempo, péssima intenção humana, e eu sigo sentindo
Liberto das coisas e mais perto daquele cais
Dentro do vento, meus olhos fecham e minha garganta seca
Penso no retorno novamente, as pessoas andam distantes [bendito seja o sonho]

Olho para trás, há vários caminhos possíveis e a escolha feita
Com o nó na garganta, o caminho a ser seguido - em frente
Ao longe - no horizonte, a abstrata linha: sem sabor, sem cheiro e sem sons
Encolhido no caminho, a tempestade e a noite agigantam-se
Mas, aqueles olhos ainda estão lá [o farol daquele cais]
E sinto aquela mão no meu ombro, mais áspera e firme pelo mérito da vida
Erigido pelo caminho, a poeira assentada na curvatura do tempo
Sigo-o – ao meu lado o amor, a um passo os meus sonhos
E no horizonte – aqueles olhos nos guiam pela noite escura
O sol surge no horizonte, estamos no cais, de onde vemos o céu, o mar e arvoredos
Para trás a tempestade – estamos rodeados por seres libertos, intangíveis
Aqui permaneço, envolto nos braços sob a luz daqueles olhos e dentro do nosso sonho

Belo Horizonte, 27 de fevereiro de 2013

(Aos meus pais)

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Zero e / ou um


Zero e/ou um
(Para Alexandre Mendes Hughes)
Eis o ser magnífico, do movimento, do pensamento, e também do sofrimento.
É o homem dicotômico do gênero aos sentidos, preso a metáforas.
Metáforas dos sentidos, sim – dos sentidos, apenas isto, nada menos.
Pensamentos metafóricos pelo simples fisiologismo
Seres reduzidos ao sentir e a responder estímulos.
Um a um, dois a dois, métricas reduzidas de um ser ... magnífico.
E antes que meu vislumbre se acabe, meu amor se esgote como gotas d’água numa biqueira,
Quero dizer, amo este ser do pensamento e pelo pensamento e apenas pelo pensar o odeio.
Na mesma medida, nos dois sentidos ou pelos sete lados ... Amor e ódio
Eis o ser dicotômico e perdido de si mesmo,
Perdido no tempo-espaço, onde toda beleza se esconde.

Frederic Mendes Hughes (01/11/2012 – 21:40)

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Estações do Ser

Estações do Ser

Janela dos mundos
penso existir
na ausência do tempo

Caminho estradas
sentindo desejos
nas manhãs que perdi

Lembranças de folhas
esquecimento dos frutos
certeza e devir

Outono dos seres
primavera das coisas
verão sem janela

O inverno é aqui
onde as manhãs se perdem
e daquela janela (...) o mundo esqueci

Afã, Espera, Quimera, Homem: Traços do Vir a Ser


Afã, Espera, Quimera, Homem: Traços do Vir a Ser

A meia luz encontra-se um ser meio homem meio macaco feito nós
Tentando sonhar com seus sonhos de vir a ser de tornar-se
E ao sonhar com seus sonhos percebe que sonha só a meia luz
E ao perceber que está só espera por novos sonhos

  Nesta quimera mítica de ser e estar enquanto homem
Ergue-se a meia luz algo disforme um infante do mundo moderno e fruto de outrora
Um homem meio pronto inacabado pelo afã do devir
Erigido por ilusões sonhos conceitos muito do oposto e pouco de si mesmo

Mas o que espera este homem além do desejo de tornar-se?
(Re)fazer e (re)nascer perante a tranquilidade de puramente ser antes de tornar-se
Esta simples aceitação enquanto só a meia luz e à sombra da sua outra metade
O impele brutalmente ao mito de Sísifo o de ser criativo na repetição e na monotonia

Mas o que fazer com o espólio da divina comédia humana deste ser atemporal?
Aprender e sublimar vendo nossos sonhos e nossas escolhas
Na perspectiva de um ser transvalorado e recriado numa antropofagia ideológica
Puramente eu simplesmente nós a plena luz do Ser.